Benfica e Sporting disputam Supertaça Feminina
Campeãs e vice-campeãs nacionais disputam o primeiro troféu da época antes de se estrearem na Liga dos Campeões Feminina.
O Estádio do Restelo, em Lisboa, recebe a primeira decisão da temporada feminina do futebol nacional. Benfica, campeão nacional, e Sporting, vice-campeão, ultrapassaram Damaiense e Racing Power nas meias-finais e definem entre si a equipa vencedora da Supertaça. O jogo surge à beira da primeira eliminatória da Liga dos Campeões Feminina, onde as duas equipas lisboetas procurarão alcançar a fase de grupos.
Sporting em modo desafio
A temporada passada só pode ter sido muito frustrante para a equipa orientada por Mariana Cabral. Apesar de ter vencido o Benfica nos dois jogos a contar para a Liga Feminina, ter o ataque mais concretizador e uma defesa menos batida, as leoas não foram além do vice-campeonato, com menos dois pontos que as suas rivais. Olhando para a valia das adversárias, o empate em Vila Verde e a derrota em Vila Nova de Gaia foram os resultados mais inesperados, sendo que qualquer um deles pode ser visto com o custo de um título. Entrando esta temporada na Liga dos Campeões Feminina, percebe-se que o Sporting não queira correr risco algum de ficar de novo apenas a um passo de alcançar novo objetivo.
Tendo vendido Olivia Smith para o Liverpool por 250 mil euros, o Sporting vê chegar pelo menos cinco jogadoras com capacidade para lutar pela titularidade, o que representa desde logo um aumento brutal da competitividade interna da equipa. Com muitas soluções ofensivas, a opção de Mariana Cabral para o jogo frente ao Racing Power passou por colocar toda a carne no assador. A dupla de avançadas composta por Brittany Raphino e Telma Encarnação é completamente disruptiva no panorama nacional. Se a elas acrescentarmos Jacynta Gala, Brenda Pérez, Maiara Nehues e Diana Silva, todas no onze titular, percebe-se que a ideia de jogo do Sporting evolui para um território onde não deixará nenhuma defesa rival tranquila. Isto numa fase onde Joana Martins está de fora por lesão.
A construção da equipa, apostando em perfis onde se equiparam qualidade técnica e capacidade física, sobretudo na dupla de centrais e na dupla de avançadas, caracteriza um jogo muito mais próximo da elite europeia onde o Sporting quer estar esta época.
Na sua quarta temporada como treinadora principal do Sporting, Mariana Cabral encontra o tipo de passo a dar para conseguir ser uma forte candidata ao título. Foi preciso convencer a estrutura do clube a dar esse passo também. Do onze das meias-finais da Supertaça Feminina, apenas Alícia Correia acompanha a treinadora desde os escalões de formação leoninos. Ana Borges já estava no plantel no momento da subida da técnica à equipa principal, enquanto todas as restantes jogadoras são fruto de investimento no mercado. Essa construção da equipa, apostando em perfis onde se equiparam qualidade técnica e capacidade física, sobretudo na dupla de centrais e na dupla de avançadas, caracteriza um jogo muito mais próximo da elite europeia onde o Sporting quer estar esta época.


Benfica depois de Kika
A saída da jogadora-símbolo do conjunto encarnado obriga a que o Benfica entre numa nova fase do desenvolvimento da sua equipa feminina de futebol. Os 500 mil euros recebidos na transferência são uma demonstração de como a formação de jogadoras pode passar a representar um modelo de financiamento das suas equipas. Para além da camisola 10, também Ana Seiça e Marta Cintra procuraram novas paragens e a equipa de Filipa Patão procurou encontrar no mercado jogadoras que mantenham o nível de opções elevado. Marit Lund chega para a lateral-esquerda, Beatriz Cameirão regressa para ser opção no meio-campo e Cristina Martín-Prieto oferece um perfil de ponta-de-lança que faltava na equipa.
Os desafios na Supertaça e nas eliminatórias iniciais da Liga dos Campeões serão os momentos para aquilatar o que ainda há a fazer para manter o domínio exercido nas últimas temporadas.
No jogo das meias-finais da Supertaça Feminina, no entanto, o Benfica encontrou algumas dificuldades para se superiorizar ao Damaiense. As lesões de Lena Pauels e Lúcia Alves retiraram outras duas jogadoras que estiveram ao nível de elite da equipa na época passada. O que se sentiu no encontro foi que o Benfica não tem ainda os mecanismos que eram o centro do seu jogo, na forma como a equipa evoluía de uma linha de 4 para 3, na forma como o meio-campo impunha uma alta rotação na recuperação de bola e lançamento de ataques rápidos, na maneira como Kika resolvia muitas situações onde a equipa talvez não estivesse à altura de se propor no coletivo.
Depois de na época passada ter conquistado todos os títulos nacionais, o Benfica da presente temporada tem uma segunda linha de jogadoras mais jovens preparadas para assumir mais minutos e sem dúvida que Cristina Martín-Prieto vem acrescentar ameaça na frente. Chandra Davidson, quando chegou na época passada, já preencheu uma dimensão física a partir da faixa que beneficia a equipa nos jogos mais exigentes, mas, pelo menos para já, entre Marie Alidou e Andreia Norton alguém terá que crescer para preencher o vazio deixado pela saída de Kika. Os desafios na Supertaça e nas eliminatórias iniciais da Liga dos Campeões serão os momentos para aquilatar o que ainda há a fazer para manter o domínio exercido nas últimas temporadas.
A quem mete medo o futebol praticado pelas mulheres?
Se ao nível das assistências médias nos estádios a Liga Feminina se mantém distante da prova masculina organizada pela Liga Portugal, o mesmo não se poderá dizer da forma como as jogadoras conquistaram o seu espaço como vozes poderosas dentro dos respetivos clubes. Para os adeptos do Benfica, do Sporting, mas também do SC Braga, do Marítimo ou do Torreense, as jogadoras da Liga Feminina têm hoje um reconhecimento e uma autonomia de discurso que as afirma como peças incontornáveis do quotidiano dos seus clubes.
Na calendarização da nova temporada, a Federação Portuguesa de Futebol teve que conseguir enquadrar uma série de fatores que tornavam o seu acerto complicado. Uma jornada da Liga das Nações marcada fora de época pela UEFA. O calendário das eliminatórias da Liga dos Campeões e a necessária preparação das duas representantes portuguesas. O encontrar de um local e de um horário que permitisse a afluência de muitas pessoas para dar ao jogo o ambiente que ele merece.
A 17 de julho de 2024, os horários das meias-finais e da final da Supertaça Feminina estavam marcados. Uma semana mais tarde, a 23 de julho de 2024, a Liga Portugal anunciou os horários das quatro jornadas de abertura da prova masculina, coincidindo os horários dos jogos do Sporting masculino com os dos dois jogos do Sporting feminino.
A quem mete medo, então, o futebol praticado pelas mulheres em Portugal? As vozes femininas têm sido capazes de construir o seu próprio palco, mesmo furando pelo meio de muitas dificuldades que continuam a imperar no contexto do seu desenvolvimento. O que o Estádio do Restelo e a transmissão televisiva do jogo em canal aberto poderão demonstrar é que há, de facto, razões para esse medo. Porque o futebol no feminino está a passar e veio para ficar.